Em 2001, o professor Roberto David da Graça, o Cocada, assumiu o comando da Federação Catarinense de Judô, uma entidade falida na época. Após 12 anos de uma gestão austera e progressista, o dirigente fez a transição e entregou a FCJ operando a todo vapor. Contudo, em pouco tempo foi banido da modalidade por seu sucessor
Problemas constantes no calendário da Confederação Brasileira de Judô, a fragilidade técnica dos eventos da TV e principalmente a queda vertiginosa do número de patrocinadores que acompanhou o movimento pós-olimpíadas Rio 2016 fizeram com que buscássemos compreender a origem dos problemas que afligem hoje a CBJ, uma entidade que até pouco tempo atrás era tida como exemplo num seleto grupo de confederações esportivas bem-sucedidas.
Esta busca nos levou a Santa Catarina, Estado de origem de Sílvio Acácio Borges, atual presidente da CBJ, e para nossa surpresa, descobrimos o caráter controverso e obscuro de um dirigente que provavelmente deverá promover um retrocesso gigantesco na modalidade.
Nascido em Joinville em 1º de setembro de 1947, Roberto David da Graça, o Cocada, faz parte da segunda geração de judocas de Santa Catarina. Formado por Kenzo Minami, lutou pela implantação e disseminação da modalidade, pela introdução do judô nos Jogos Abertos, pela fundação da Federação Catarinense de Judô e, posteriormente, promoveu o resgate de uma entidade que soçobrava à deriva, mergulhada em dívidas.
Nesta entrevista, ele conta um pouco de sua trajetória na FCJ e na CBJ ao longo dos anos e revela o que ocorre nos bastidores do judô brasileiro. Arrependido de decisões que tomou no passado, o ex-presidente da FCJ mostra agora enorme decepção com pessoas que antigamente considerava amigas.
Uma vida nos tatamis
Quando deu os primeiros passos nos tatamis?
Tudo começou em 1962, quando Kenzo Minami chegou a Santa Catarina e deu início à prática do judô em nosso Estado. Dei meus primeiros passos nos tatamis em 1964, no dojô de um clube de remo, modalidade muito popular naquela época, o Clube Náutico Atlântico.
Por que começou num esporte sem nenhuma expressão nacional naquela época?
Sempre fui briguento e me aconselharam a fazer judô. Felizmente deu certo.
Há quantos anos você está nos tatamis e qual é o seu tokui-waza?
Levo 54 anos nisso. Peguei minha faixa preta em 1974, após dez anos de prática. Meu tokui-waza é o morote-seoi-nage e o ko-uchi-maki-komi, que naquela época chamavam-se sutemi-ko-uchi e posteriormente passei a utilizar o hane-goshi.
Como foi a sua trajetória nos tatamis?
O professor Kenzo sempre foi muito minucioso e saber o bê-á-bá era fundamental. Primeiro era preciso aprender o ukemi; em seguida, o shintai e o kumi-kata. Depois de ter os fundamentos básicos muito bem assimilados, ele liberava os alunos para fazerem randori e, posteriormente, shiai.
Quando debutou no shiai-jô?
Foi em 1965, quando fomos para uma competição em Curitiba, na qual conheci o sensei Yoshio Kihara, de São Paulo. Além dele, tive o prazer de conhecer os senseis Makoto Yamanouchi e Kenjiro Hironaka. Nosso primeiro encontro com judocas de Brusque, Florianópolis, Blumenau e Criciúma ocorreu apenas em 1969, num evento realizado em Florianópolis. O pessoal da capital era liderado pelo professor Takehisa. Mais tarde nos aproximamos e formamos o grupo que permitiu a introdução do judô no Jogos Abertos.
Você era bom de briga?
Naquela época o judoca lutava, arbitrava, era mesário, carregava tatami e fazia tudo que precisasse para tocar as competições de um esporte desconhecido. A primeira grande competição do Estado foram os Jogos Abertos de 1971, e já na primeira edição conquistei várias medalhas, sendo quatro de ouro: no peso leve, no absoluto, por equipe e como técnico, pois o sensei Kenzo era o coordenador do certame. Os Jogos Abertos eram a principal competição da época e entre 1971 e 1985 conquistei 25 medalhas, das quais 16 de ouro, sendo 9 no individual e 7 por equipe e como técnico. Participei dos campeonatos brasileiros de 1973 e 1975, mas nunca medalhei. Como técnico da seleção catarinense sou tricampeão brasileiro sênior.
Qual foi a importância de São Paulo e Paraná no desenvolvimento do judô catarinense?
Por mais que muita gente não goste de admitir, nossa história teve origem no judô paulista e no paranaense. Kenzo Minami, meu sensei, veio do Japão e desembarcou em Santos. Primeiro fez um estágio em São Paulo, depois passou por Curitiba e posteriormente veio para Joinville. Alguns anos depois recebemos o sensei Kasuo Konishi, oriundo do interior paulista, que se constituiu numa espécie de desbravador de judô em todo o Estado. Nossas referências sempre foram os renomados mestres paulistanos ou japoneses radicados na capital paulista. Entre eles destaco os lendários Ryuzo Ogawa, Yoshio Kihara, Fuyu Oide, Massao Shinohara e Mário Matsuda. Eu mesmo comecei com sensei Kenzo, mas me aperfeiçoei tecnicamente em Curitiba com os senseis Kenjiro Hironaga e Makoto Yamanouchi. Lembro também do hoje professor kodansha 7º dan, Ney de Lucca Mecking que me levou a adotar o hane-goshi. O professor Kenjiro era japonês, e Makoto é um sensei paulista radicado no Paraná, onde fez escola. Minha primeira promoção para faixa azul foi assinada pelo sensei Rodolfo Dias Prestes, de Curitiba, que também ensinava karatê. Meu sensei conhecia todos os mestres japoneses radicados em São Paulo, para onde ele recomendava que fôssemos em busca de aperfeiçoamento. O eixo central do judô era São Paulo, Curitiba e Londrina.
São Paulo e Paraná também foram decisivos na arbitragem?
Indubitavelmente. Por Santa Catarina passaram grandes ícones da arbitragem, como Carlos Catalano Calleja, Dante Kanayama e Shigueto Yamassaki. Anos depois vieram Emmanoel Andrade Mattar, o Maranhão (RJ) e Edison Koshi Minakawa. O Paraná teve atuação decisiva na implantação e no desenvolvimento da arbitragem catarinense. Vários professores contribuíram decisivamente, com destaque especial para o professor kodansha (8º dan) Kenjiro Hironaka.
Como foi fundada a Federação Catarinense de Judô?
Em 1971 já tínhamos reunido o número de entidades necessário para fundar a federação. Por determinação do professor Kenzo Minami, fui conhecer os estatutos das federações do Paraná e do Rio Grande do Sul, e com base neles montei o nosso estatuto, entregue aos 12 dirigentes das entidades que participariam da fundação. Sensei Kenzo mandou entregar toda a documentação ao professor Kazuo Konishi em outubro de 1972, e em maio de 1973 ele fundou a entidade.
Quando começou sua gestão?
Depois de auxiliar o professor Kazuo Konishi por muitos anos, em 2001 assumi a FCJ, que se encontrava numa situação bastante adversa. A entidade estava insolvente e com um déficit correspondente a vários anos de sua receita. Felizmente, toda a comunidade abraçou a causa e uniu-se em torno da busca de soluções. Após quatro anos de muita luta conseguimos zerar o débito deixado pela gestão anterior.
Por que assumiu este compromisso?
Pelo simples fato de a federação correr sério risco de acabar. A má gestão estava parando o judô catarinense. Acima de tudo fizemos uma gestão fundamentada na união de todos os professores do Estado e encerramos o primeiro quadriênio com as contas equilibradas. Posteriormente atingimos nosso objetivo, que era entregar a entidade com as contas sanadas e o judô do nosso Estado funcionando a todo vapor.
Como aconteceu a criação do Meeting Interestadual de Judô?
Em 2002 a CBJ excluiu de seu calendário os eventos para as crianças. Em reunião realizada em Curitiba, dirigentes de quatro Estados – os professores Francisco de Carvalho (São Paulo), Renato Fruehwirth (Paraná), Matias Pauli de Azevedo (Rio Grande do Sul) e eu, por Santa Catarina – decidiram criar um evento voltado para a base. O meeting, que atendeu às nossas expectativas, realiza-se desde 2004 e, por sugestão do professor Chico, sediamos a primeira edição. Até hoje a competição ocorre em nosso Estado, tornando-se decisiva para o desenvolvimento técnico do judô catarinense devido ao grande intercâmbio técnico que oferece.
Por que fez a transição?
Ficamos à frente da federação por três mandatos e fizemos tudo que havíamos planejado no sentido de reconduzir a entidade à normalidade. Mas o fator determinante é que eu e minha esposa Lelis, que era diretora administrativa, já estávamos cansados e achávamos que a FCJ precisava de sangue novo. Propusemo-nos a continuar ajudando, colaborando e dando suporte no que fosse preciso.
Quais eram os professores que o auxiliavam na administração?
O Oscar Grando era responsável pela área técnica, Sílvio Acácio Borges cuidava da arbitragem e Moisés Gonzaga Penso, meu vice-presidente, ajudava na condução e no comando da entidade.
Como definiu seu sucessor?
Em 2012, iniciei o processo de transição e, seguindo o princípio da meritocracia, decidi que meu sucessor seria um dos três professores mais atuantes e comprometidos com a gestão. Mesmo porque eles eram os mais preparados.
Quem eram estes judocas?
Oscar Grando, Sílvio Acácio e Moisés Gonzaga Penso, o meu preferido. Além de ser meu vice, o conhecia desde criança e sabia que era uma excelente pessoa, filho do Camilo Penso, ex-presidente e um dos judocas mais éticos e criteriosos de Santa Catarina. Naquele momento o Moisés ainda competia, mas sempre teve um diferencial sobre os demais dirigentes: além do excelente caráter, ele era agregador e um grande mediador, muito querido e respeitado por todos por sua postura ética.
O que aconteceu?
Chamei os três para uma reunião e expus os fatos. Falei da minha preferência pelo Moisés, mas lamentavelmente na mesma hora ele declinou por que ainda estudava e precisava priorizar a faculdade. O problema foi que o Moisés optou pelo Sílvio e eu acabei seguindo sua indicação. Achei por bem deixar todas as questões do passado de lado, e dei mais um voto de confiança para o Sílvio Acácio.
Uma vida pautada na mentira e na ingratidão
Os três professores vinham de escolas distintas: Oscar, aluno do Shigeru Sogo, Moisés vinha da linha de Kazuo Konishi e Sílvio era aluno do Kenzo Minami, certo?
Não, errado!
Como assim?
O Sílvio Acácio não foi aluno do sensei Kenzo Minami.
Mas ele afirma que foi aluno do professor Kenzo.
Isso é problema dele. Formei o Sílvio e só depois que era adulto, faixa preta e professor em Jaraguá do Sul é que parou de treinar conosco. Quando ia a Joinville, ele frequentava o dojô do meu sensei, mas fui eu que o ensinei a fazer a saudação, aquecimento, kumi-kata, ukemi, as técnicas de projeção e posteriormente o formei faixa preta. Até entendo que ele possa ter algum problema de memória e esquecido tudo isso, mas este processo levou cerca de dez anos e, para azar dele, eu não esqueci.
Você está afirmando que toda vez que fala de sua origem ele mente?
Não. Estou afirmando que ele foi meu aluno. O Sílvio e meu irmão Rubens eram amigos da infância e moravam na mesma rua, os dois andavam aprontando e levei ambos para o dojô da Associação Atlética Tupy, que pertencia à Fundição Tupy, de Joinville. Além disso, possuímos documentação e até mesmo publicações da Fundição Tupy, nas quais ele figura como aluno e atleta da nossa escola. A ingratidão é uma de suas características mais marcantes. Aliás, ele jamais teve que comprar um judogi, pois a Tupy fornecia todo o equipamento utilizado por seus atletas.
Então, por que ele afirma que foi aluno do sensei Kenzo?
Sinceramente, eu não imagino e sugiro que pergunte a ele. Mas adianto que o Sílvio possui uma personalidade complexa e não segue os padrões morais com os quais estamos acostumados.
Quantos anos o Sílvio tinha quando iniciou?
Algo em torno de 12 anos. O Sílvio e meu irmão Rubens acabaram formando-se faixas pretas.
Ele era bom de judô?
Não. Ele sempre foi muito limitado tecnicamente.
Mas se destacou na arbitragem e foi um grande árbitro, certo?
Errado. Ele também não foi um bom árbitro. O judoca que não faz uso do conhecimento técnico que recebeu, não pode sair-se bem na arbitragem, a não ser que posteriormente estude muito. A arbitragem e o judô não são coisas distintas. São a mesma coisa. Não existe simbiose quando não existe conhecimento. Ele avançou por questões meramente políticas, numa época em que não havia os recursos de que dispomos na atualidade. Hoje ele não passaria de FIJ C.
E como chegou à FIJ A?
Politicamente. Na base da indicação. Santa Catarina precisava colocar um árbitro no cenário nacional, mas lamentavelmente o professor Márcio Roberto Silva, nosso melhor árbitro na época, se envolveu com a arbitragem do judô universitário e acabou perdendo espaço na CBJ. O presidente Paulo Wanderley sempre expunha a necessidade de termos alguém do Estado no topo da arbitragem nacional. Tive de atender ao pedido dele e acabei indicando o Sílvio. Foi assim que ele chegou ao topo e tornou-se FIJ A, mas tanto no shiai-jô quanto na arbitragem ele sempre teve uma atuação limitada.
Quando assumiu a CBJ, ele disse que era pioneiro na arbitragem da Região Sul e o primeiro catarinense medalhista em campeonatos brasileiros. Isso procede?
Não procede. Não é verdade. Era seu professor e sempre o acompanhei nas competições. Ele lutou no brasileiro de 1975, mas não medalhou. Basta conferir nos arquivos da época. Aliás, ele nunca conquistou nenhuma medalha em competições nacionais. Ele obteve duas medalhas de ouro nos Jogos Abertos de Santa Catarina. Isto de medalha de bronze em brasileiros é uma mentira recorrente. Acho que já repetiu esta mentira tantas vezes que acabou acreditando. Estes fatos são absolutamente irrelevantes, mas mostram seu caráter. Um judoca de verdade não se presta a este tipo coisa.
Como define o seu ex-aluno?
Quando o saudoso professor Sérgio Adib Bahi, ex-presidente da União Pan-Americana de Judô e vice-presidente da International Judo Federation (FIJ), queria definir judocas com postura duvidosa, ele dizia que a pessoa entrou no judô, mas o judô não entrou na pessoa. Minha leitura é que foi isso que aconteceu com ele. O Sílvio entrou no judô, fez sua vida nos tatamis e com a ajuda de algumas pessoas e por mérito próprio obteve sucesso, mas parece que lamentavelmente o judô jamais entrou nele.
Quando ele passou a treinar com o professor Kenzo Minami?
Devido à minha afinidade com o sensei Minami, ele e todos os meus alunos tinham o hábito de esporadicamente treinar no seu dojô. Ele ficou muitos anos comigo até se formar faixa preta e depois foi trabalhar como professor de judô em Jaraguá do Sul.
Foi a partir desse momento que ele deixou de frequentar seu dojô?
Não. Foi a partir daí que iniciou o processo de negar toda a sua origem.
Isso o chateou?
Depois que me formei e passei a dar aula, o primeiro grupo de alunos que formei faixas pretas era composto por quatro judocas e o Sílvio fez parte dessa leva. Aliás, ele reprovou no primeiro exame e no ano seguinte refez a prova e passou. Muita gente me acusava de agir como pai dele, por sempre perdoar e passar a mão em sua cabeça. O conheço desde que era criança e sempre vi, ignorei e relevei suas limitações. Talvez eu tivesse, sim, um olhar paternalista, mas é claro que me chateou muito.
Qual era o tokui-waza dele?
Sinceramente, não lembro. Como disse antes, ele não possuía técnica refinada, mas lutava com certa inteligência. Posso afirmar que o forte dele era o ne-waza.
Em março, a FPJudô concedeu o sexto dan para quatro delegados regionais e o presidente da CBJ se indignou e fez o maior alarde. Como o Sílvio chegou ao 7º dan?
Na verdade, ele só prestou exame para sho-dan. Todas as demais graduações foram presenteadas ou negociadas com o professor Kazuo, que o promoveu até o go-dan. Já o 6º e o 7º dan fui eu que solicitei para a CBJ. Com exceção do sho-dan, o Sílvio jamais fez exame de graduação.
Como seu ex-aluno pode ter a mesma graduação que você?
Na verdade, em 2013, a CBJ emitiu meu certificado de 8º dan, que foi assinado pelos professores João Rocha, ex-vice-presidente da CBJ e presidente da comissão nacional de graduação da entidade, e pelo professor Paulo Wanderley, ex-presidente da CBJ e atual presidente do Comitê Olímpico do Brasil (COB). Este certificado foi enviado para a federação catarinense, mas jamais chegou às minhas mãos.
Como assim?
Há cinco anos, a comissão de graduação da CBJ emitiu meu hachi-dan (8º dan), que foi enviado para a federação quando o Sílvio já era presidente, e ele não permitiu que chegasse às minhas mãos.
Como você tem esta certeza?
Porque os professores João Rocha e Paulo Wanderley afirmaram que assinaram o certificado e a CBJ o enviou para a FCJ, junto com o certificado de shichi-dan (7º dan) do professor Oscar Grando.
Mas então, por que você diz que é 7º dan?
Espera, vou desenhar: porque o meu bendito certificado chegou primeiro às mãos do Sílvio Acácio Borges, que naquele momento era presidente da Federação Catarinense de Judô, e ele jamais permitiu que chegasse às minhas mãos. Cobrei da Ângela diversas vezes, mas foi em vão. Meu certificado e o do Oscar Grando vieram juntos, mas ficaram engavetados. Depois de eu brigar e cobrar por mais de um ano, o Sílvio resolveu liberar o documento do Grando, mas o meu desapareceu.
Mas e o Zempo?
Que Zempo? Eu também fui deletado do banco de dados da CBJ. Basta conferir. Lá vemos até nomes de judocas falecidos. Estou vivo, ainda uso judogi e fui deletado, ou melhor, também fui banido do Zempo.
O que o professor Paulo Wanderley fala sobre tudo isso?
Veja bem, depois que saí da presidência e deixei de representar um voto para ele, as coisas mudaram. Fui deletado em todos os níveis.
Por que seu ex-aluno faria uma maldade dessas?
O Oscar Grando era um professor e dirigente querido por todos, e o Sílvio tem um grande problema para lidar com este tipo de situação. Tem necessidade de estar acima de tudo e de todos. Já sobre a minha graduação, sugiro que pergunte a ele e ao professor Paulo Wanderley Teixeira.
Quem era o Sílvio até ele assumir a presidência da FCJ?
Chamava-me de professor e me tratava com enorme reverência e deferência. No campo da gestão, tenho de ser sincero em dizer que foi um grande colaborador, mas lamentavelmente sempre tive problemas sérios com ele e o Icracir. Ambos sempre depreciaram a minha administração, e eu fazia vista grossa. Recentemente, estivemos num evento em Florianópolis e ele nem me cumprimentou.
E depois que ele assumiu a Federação Catarinense de Judô?
Ele literalmente virou o cocho. Quando o indiquei para a presidência da FCJ, enfrentei sérios problemas com toda a comunidade de Santa Catarina. Os professores não se conformavam com a minha indicação. Todos me questionaram, principalmente por seu histórico de mau-caratismo, traição e ingratidão.
Como assim, que histórico é este?
Ele não era uma pessoa confiável e por inúmeras vezes deixou bem claro quais eram seus verdadeiros propósitos, mas eu não acreditei que seria capaz de continuar errando eternamente. Mas estava enganado, lamentavelmente.
Do que está falando?
Primeiro, ele negou e nega até hoje que aprendeu judô numa escola da periferia de Joinville, que se parecia com o que hoje chamamos de projetos sociais. Ele sempre teve dificuldade para aceitar sua origem sociocultural, e depois que passou a dar aulas no Baependi, chamava sua própria escola de pocilga e menosprezava seus colegas de dojô. Depois, inventou a história de que era aluno do meu sensei, o professor Kenzo Minami. Quando havia eleição na FCJ, todos em Joinville votavam em bloco, e por diversas vezes ele e o Icracir nos traíram, votando no candidato que fizesse a melhor proposta e trocando apoio político por graduação. Depois, forjou uma situação contra o Clube Atlético Baependi, agremiação que serviu por décadas e deu a ele tudo que possui hoje. Depois, entrou com uma ação trabalhista contra a prefeitura de Jaraguá do Sul, em que atuou por muitos anos. Por onde passa arruma inimizades e deixa rastros de destruição. Na FCJ não foi diferente. No último ano de mandato falava que iria entregar o cargo, mas esta foi apenas mais uma de suas mentiras. Saiu porque sabia que não iria reeleger-se. Ele foi o presidente com maior índice de rejeição, rachou o judô em Santa Catarina e fez com que a entidade perdesse um número gigantesco de professores e atletas.
“Eticamente falando, a nomeação do Icracir Rosa para a presidência da comissão de graduação da CBJ foi um desastre sem precedentes na história da Confederação Brasileira de Judô. O Icracir é sócio dele na Associação Colon de Judô. Isso é nepotismo, é antiético e amoral. Sob o ponto de vista da meritocracia, a indicação é escandalosa e acintosa.”
Como ele e o Icracir conseguiam trair o grupo?
Dou um exemplo: em 1982, houve eleição e todos os dojôs do litoral e alguns da região serrana apoiaram minha chapa, que apresentava o sensei Camilo Penso como vice e o professor Kenzo Minami como diretor técnico. Fomos para a assembleia realizada em Videira com a eleição ganha, pois tínhamos maioria. Para nossa surpresa, o Sívio e o Icracir negociaram com o outro candidato, traíram todo o grupo e o Kazuo Konishi foi eleito. O professor Camilo ficou tão revoltado com a traição dos dois que se dirigiu ao Kazuo e disparou: “Se fosse para nós vencermos a eleição recebendo apoio das pessoas que o apoiaram, preferíamos não vencer”.
Mas por que fizeram isso?
Por graduação. Traíram cerca de 20 professores por graduação. Ele vive falando que é aluno do sensei Kenzo, certo? Então, neste episódio, ele também traiu seu professor para obter mais um dan em sua faixa preta. Mas, na verdade, ele traiu o judô catarinense. Traiu a mim, ao Kenzo, ao Camilo e aos professores que tinham expectativas e projetos atrelados àquela eleição. Ele sempre foi imprevisível e inconsequente.
No ano passado, o presidente da CBJ desfez a comissão de graduação e nomeou o professor Icracir Rosa para a presidência. Como avalia esta indicação?
O professor Icracir é conhecedor de judô e até foi meu coordenador de graduação por muitos anos, mas na prática ele jamais redigiu um regimento interno. Eu acabava fazendo tudo. Eticamente falando, a nomeação foi um desastre sem precedentes na história da Confederação Brasileira de Judô. O Icracir é sócio dele na Associação Colon de Judô. Isso é nepotismo, é antiético e amoral. Pergunto: qual é a legitimidade da atual comissão de graus da CBJ? Já sob o ponto de vista da meritocracia, a indicação é escandalosa e acintosa. Guardo certo carinho por ele, mas estamos falando de uma pessoa limitada para assumir este cargo. Mas sua nomeação é típica do Sílvio. Ele sempre se cerca de pessoas submissas a ele, as quais manipula com extrema facilidade.
Como assim?
O Icracir não possui embasamento ético e filosófico para ocupar um cargo que demanda protagonismo. Até o Sílvio assumir a CBJ, a comissão de graduação era comandada pelo professor kodansha João Rocha (MS), uma pessoa íntegra e acima de qualquer suspeita. A antiga comissão era constituída por nomes de grande expressão, como os professores kodanshas Yoshihiro Okano (PR) e Odair Borges (SP), ambos estudiosos e com formação no Instituto Kodokan de Tóquio. Soube que as nomeações para a nova comissão de graduação foram meramente políticas. Chegaram até a nomear professores que depois foram descartados porque politicamente não agradaram ao ex-dirigente da entidade.
Banido do judô por seu próprio aluno
Quais são as principais características de seu sucessor?
Centralizador, egocêntrico, prepotente, inconsequente e vingativo. Se por qualquer motivo ele não gostar de um professor, vai persegui-lo implacavelmente. Já deve estar fazendo isso na CBJ. Ele perseguia seus desafetos implacavelmente, e nem documentos de transferência de atletas ele liberava. Esteja certo de que, mesmo estando na CBJ, vai continuar perseguindo os judocas catarinenses dos quais não gosta. Pergunte aos professores do nosso Estado, e eles confirmarão.
Mas, se o conhecia tão bem, por que o colocou na presidência?
Ele sempre foi muito ambicioso e eu acreditava que sua ascensão à presidência projetaria o judô de nosso Estado no cenário nacional. Ele também foi meu braço direito e me ajudou muito. O fato marcante é que nos anos em que atuou na gestão ele apresentou grande mudança. Foi menos egoísta e ambicioso, quase não cometeu atos de insubordinação, mas eu estava enganado. Não deu certo. Nem bem assumiu o comando, já revelou que dentro de si guardava coisas piores.
Como assim, não deu certo?
Com autoritarismo ímpar, ele primeiro afastou o Oscar Grando, que era unanimidade e representava alto risco, depois se livrou de mim e da Lelis. Por último, afastou muitos professores e rachou a modalidade.
Se o Grando colocasse uma chapa, venceria o Sílvio no voto?
Indubitavelmente. Os professores conheciam muito bem os dois e muito provavelmente o Grando venceria por aclamação. Ninguém pode imaginar o que ouvi por tê-lo indicado. Como bom judoca, o Oscar achou por bem apoiar a minha decisão, e hoje ele e eu estamos fora da modalidade que ajudamos a edificar nos últimos 50 anos.
Arrepende-se de sua escolha?
De forma alguma. Fiz minha escolha com plena consciência. E mais: o Moisés também achou que era a vez dele, e o Grando se resignou em respeito à minha decisão. A única coisa de que me arrependo é de algo que fiz atendendo a um pedido do Sílvio, e este erro tem-me tirado o sono nos últimos anos.
O que você fez de tão grave?
Recebi uma ligação vinda de Jaraguá do Sul, do presidente do Clube Baependi, solicitando uma reunião. Em seguida, liguei para o Sílvio, porque ele era o responsável pelo departamento de judô do clube jaraguaense, e avisei que receberia o presidente do clube que iria a Florianópolis acompanhado por dois advogados. Na mesma hora, ele disse que teria de ajudá-lo, pois havia entrado na Justiça contra o clube. Ele fez cobranças indevidas, e uma delas era referente às competições realizados pela FCJ. No processo ele declarou que não recebia pagamento da FCJ para atuar como árbitro nos eventos que ocorriam nos fins de semana e que por isso o clube deveria ressarci-lo por todas as atuações nos certames de Santa Catarina.
E você concordou?
De pronto não. Disse que não me prestaria a um papel desses, mas ele ameaçou fazer uma devassa em minha vida e prometeu acabar comigo se não o ajudasse. Mesmo contrariando meus princípios, acabei mentindo e o clube pagou a conta. Na verdade, ele e os demais árbitros sempre receberam pagamento da FCJ. Faz muitos anos que isso aconteceu, mas até hoje me cobro e me envergonho de ter apoiado esta falcatrua. Isto me incomoda até hoje.
Qual é o papel do professor Nélson Wolter no judô catarinense?
Bom, este personagem folclórico é um capítulo à parte na história da FCJ. Acho que há mais de 30 anos ele está entranhado na estrutura da federação. Mas lembro que na década de 1970 o sensei Kazuo fazia incursões no Oeste Catarinense e o Nélson já o acompanhava naquelas viagens. Resumindo, há décadas a FCJ é sua hospedeira.
Qual é a graduação dele?
Ele é 6º dan, mas acho que não fez kata nem para sho-dan. Acredito que não sabe fazer nem o nage-no-kata. Nunca teve destaque como professor ou como atleta. Seu melhor resultado foi um quinto lugar nos Jogos Abertos, o que é muito pouco para um judoca que tinha mais de 150 kg.
Já que citou a questão do Baependi, como foi a administração do Sílvio no aspecto financeiro?
Foi cruel e implacável. Com ele as escolas perderam poder de negociação. A maioria dos dojôs do nosso Estado depende das fundações municipais de esporte de suas cidades que, por sua vez, iniciam a atividade no mês de abril. Nosso calendário começa em fevereiro, e nas gestões anteriores permitíamos que os associados recolhessem as taxas em abril. Meu sucessor não tinha a mesma paciência e a norma era simples: quem não pagasse em fevereiro estaria fora do calendário anual.
Mas ninguém tentava intermediar?
Sim, por diversas vezes fui a Joinville para tentar demovê-lo de suas decisões, mas ele dizia que o judô não pode ser pobre e nem foi feito para pobres.
E como vocês equacionavam esta situação quando estavam à frente da FCJ?
Dávamos prazo. Assim que as prefeituras creditavam os recursos, os dojôs os repassavam para a FCJ. Nunca nenhum professor falhou ou deixou de cumprir esse trato. O problema é que Sílvio é uma pessoa má e gostava de humilhar os professores. Numa ocasião o fiz lembrar que nem todos tiveram a sorte que ele e o Icracir tiveram no início. Ele enrubesceu e encerrou o assunto.
Mas, e no tocante às contas e o financeiro da FCJ?
Ele sempre se vangloriou de ter feito um caixa gigantesco para a entidade, mas não foi isso que seu balanço final mostrou. Pelo que soubemos ele entregou a entidade com o caixa zerado. Quando nós fizemos a transição deixamos um carro Renault que havia sido adquirido pela entidade. Recentemente eu fiz uma busca no Detran e constatei que hoje o veículo está no nome de Geisa Almeida, esposa do professor Cláudio Almeida, sobrinho do Sílvio. Estranho não? Também houve problemas relacionados a práticas ilícitas. O Sílvio cobrou alugueis mensais da FCJ por armazenar monitores de TV da entidade em seu dojô. Isso foi comprovado por meio dos balanços da entidade e deu problema. Ele foi interpelado por advogados de Florianópolis por cobrar taxas abusivas. Toda vez que os professores queriam reclamar nas competições, tinham de recolher taxas absurdas e proibitivas. Ele se deu mal.
Em 23 de junho de 2017, o professor Sívio levou o veículo Hyundai Sonata de propriedade da CBJ para Joinville, e até hoje este automóvel nunca mais voltou para o Rio. Como vê isso?
Ele sempre conseguiu me surpreender com a sua imprevisibilidade, mas eu acho que ele ainda não se deu conta que de que está num cenário maior e que sua exposição é proporcionalmente maior. Eu conheço este veículo porque é o mesmo que o professor Paulo Wanderley usava oficialmente sempre que os dirigentes estaduais iam ao Rio de Janeiro.
Na cerimônia de posse do Moisés Penso, o Sílvio e o Paulo Wanderley estavam receosos do que o Nélson Wolter poderia fazer. Você tem ideia do que estava acontecendo?
Todos sabem que o Nélson queria assumir o comando da FCJ e seu falatório era constante. Mesmo sendo membro do atual conselho fiscal da FCJ, todos falam que ele já está em campanha. Aliás, soube que até mesmo nos bastidores da CBJ já comentam que o Sílvio trabalha na eleição do seu sobrinho, Cláudio de Almeida. O Nélson Wolter corre por fora, mas também conta com o apoio do Sílvio, é claro.
Qual é a lógica disso?
Ele usa a estratégia utilizada por Paulo Wanderley quando lançou o pior nome, e a oposição o confrontou. Por meses o ex-presidente da CBJ envolveu a oposição numa briga estéril contra a nomeação do Robnelson Ferreira, e nos minutos finais da prorrogação lançou o nome do Sílvio e todos aplaudiram. Ele sabia que, se lançasse o catarinense antes, a oposição teria tempo e derrubaria sua indicação. Mas o Sílvio esquece que ele não é o Paulo e que qualquer indicação sua será rejeitada em Santa Catarina. Todos sabem muito bem o que ele representa, e aqui ele não elege ninguém.
Como o fica a situação do Moisés nesse quadro?
Os mais inexperientes diriam que está muito difícil, mas eu entendo ele tem-se posicionado muito bem na gestão, sendo elogiado por quase todos os professores com os quais me relaciono. O Moisés tem algo a seu favor que nenhum dos três jamais terá: o apoio incondicional da maioria dos professores que trabalham de verdade pelo judô no Estado. Fora isso todos sabem muito bem quem são estes três personagens. Nenhum mal dura para sempre e, pelo menos em Santa Catarina, Nélson, Cláudio e Sílvio estão com os dias contados.
O Nélson foi muito atuante na gestão do Sílvio?
Na gestão do Sílvio Acácio o Nélson atuava como coordenador, sumuleiro, e recebia pagamento da FCJ, o que é totalmente ilegal. Nenhum membro do conselho fiscal pode ter atribuições nas demais áreas da entidade ou receber pagamentos. Pelo que soube com os meus colegas, o Moisés acabou com a farra dele e conseguiu neutralizar suas investidas. Acredito que o nosso presidente só vai decolar mesmo no momento em que se livrar dos xerifes que o Sílvio deixou nos vários setores da entidade.
Como assim xerifes?
O Sílvio está no Rio de Janeiro, mas todos sabem a pressão que exerce na federação catarinense. Ele andou barrando árbitros escalados para competições nacionais, tentou barrar graduações de alunos de seus velhos desafetos, interferiu e cancelou eleições setoriais realizadas aqui e tenta interferir acintosamente na gestão. Mas acredito que em breve ele também será neutralizado. O Moisés é extremamente habilidoso e certamente vai livrar-se dele, mesmo porque, ou ele mata a cobra ou a cobra o engole vivo.
Durante a gestão de seu sucessor, o judô catarinense avançou ou retrocedeu?
Em nível de rendimento despencou. Na área financeira eu já respondi que ele enfeitou o pavão, mas no momento da transição o caixa estava zerado. Mas houve sim uma modernização na gestão, mas muita gente foi alijada por não corresponder às expectativas financeiras e políticas do ex-presidente.
Falando nisso, soubemos que após a sua saída da FCJ o Nélson acusou sua esposa de improbidade administrativa. O que aconteceu de fato?
Na verdade, não foi apenas o Nélson. O Sílvio também a acusou. A Lelis era supervisora administrativa da federação e depois que saímos eles disseram uma série de inverdades, mas jamais provaram nada contra ela. Nunca apresentaram nenhum documento. Foi pura falácia com o intuito de denegrir e comprometer a nossa passagem pela federação.
Vocês processaram os dois?
Eu já era membro do conselho fiscal da Confederação Brasileira de Judô, e não queria ser pivô de um processo contra uma filiada da CBJ. A Lelis pediu insistentemente para contratar um advogado, mas eu não concordei. Por diversas vezes ela acudiu os dois mal-agradecidos em momentos difíceis de suas vidas, mas na verdade ambos são dois cafajestes ingratos. Duas pessoas que desconhecem princípios básicos do judô como jita-kyo-ei e sei-ryoku-zen-yo. Ambos jamais serão judocas de verdade porque desconhecem que a única vitória que perdura é a que conquistamos sobre a nossa própria ignorância.
Durante 12 anos você apoiou as políticas implementadas por Paulo Wanderley. Após deixar a FCJ você ainda o apoiou por mais quatro anos, como membro do conselho fiscal. Quando decidiu trocar a CBJ pelo COB ele fez algum agradecimento pelo apoio incondicional?
Não. Jamais. Aliás, até hoje aguardo uma ligação dele. Em contrapartida, mesmo nunca o tendo apoiado, não passa uma data sem que o professor Chico nos cumprimente. Ele sempre é presente e se preocupa conosco e pergunta se estamos bem. Além de implacável, o tempo é revelador e nos mostra quão errados fomos em determinados momentos de nossas vidas.
Quando o Paulo decidiu conduzir o Sílvio à presidência você não foi informado?
O Paulo Wanderley e todos os demais presidentes estaduais do Brasil souberam de todo o drama que vivemos com o Sílvio Acácio Borges. O Paulo jamais me disse nada ou me procurou.
O ex-presidente da CBJ sabia quem ele estava indicando para assumir o comando da entidade?
Claro que sabia. Tudo que Sílvio fez nos quatro anos à frente da FCJ foi relatado. Ele sempre lamentava muito e mostrava surpresa com os desvios comportamentais do Sílvio, mas na verdade ele não deu bola a tudo que eu e inúmeros professores dissemos a ele, e mesmo assim ele o conduziu à presidência da CBJ. Acho que ou ele fez isso de propósito para ser lembrado como o melhor dirigente de todos os tempos, ou fez isso para deixar o caminho livre para uma eventual volta.
Qual é o sentimento que fica sobre o presidente do Comitê Olímpico do Brasil?
Somente após os fatos ocorridos em 2017 é que me dei conta de que nunca representei absolutamente nada além de um voto. Portanto, na hora em que a bomba estourar, espero que cobrem o Paulo Wanderley Teixeira. Não quero ser cobrado pelo que acontecerá na CBJ.
Nos bastidores das modalidades olímpicas já dizem que Paulo Wanderley não se reelege. Você crê que esta afirmação reforça sua teoria de que usa o Sílvio para pavimentar sua volta à CBJ?
O Paulo é um dos dirigentes mais astutos que conheci. Espero qualquer coisa dele. Mas nenhum mal perdura para sempre. Veja o fim do Nuzman.
“O Paulo Wanderley fez uma grande administração porque em sua época existia uma oposição fortíssima, que o fazia rever a gestão periodicamente. O Sílvio governa sozinho, comete erros à vontade e todos aplaudem. A diferença é que, juridicamente falando, hoje as coisas mudaram e todos os 27 presidentes assinam o balanço da CBJ e são corresponsáveis.”
Durante quatro anos, você foi membro do conselho fiscal da CBJ e nesse período algumas vez exerceu alguma atividade?
Participei das assembleias para as quais era convocado, mas jamais fiz análise de um balancete da CBJ. O Renato Araújo, o gestor financeiro da CBJ dizia que os auditores já haviam ajeitado tudo, e apenas nos mostrava onde deveríamos assinar, e ponto final. Tudo vinha pronto. Eu apenas assinava.
Após todo o grande revés político que viveu, como avalia a importância da oposição na gestão de uma entidade como a CBJ?
Lamentavelmente só hoje percebo o quanto errei por me negar a escutar pessoas que tentaram mostrar-me outro lado. Vendo a postura dos atuais presidentes estaduais me divirto muito. Hoje vejo quase todos como um bando de títeres alienados que desconhecem o poder que possuem. Não entendem que o poder está em suas próprias mãos, e não nas mãos do presidente da CBJ. Ficam lambendo os pés de um dirigente despreparado e atônito, que está levando o judô para a beira de um precipício. Contudo, eles ficam de quatro implorando pelas migalhas que cairão em seus pratos.
E como era antes?
O Paulo Wanderley fez uma grande administração porque na época dele existia uma oposição fortíssima, que o fazia rever a gestão periodicamente. O Sílvio governa sozinho, comete erros à vontade e todos aplaudem. A diferença é que, juridicamente falando, hoje as coisas mudaram e todos os 27 presidentes assinam o balanço da CBJ e são corresponsáveis. Na hora em que a gestão explodir todos serão responsabilizados. Foi a força da pressão exercida por Francisco de Carvalho que levou o professor Paulo a projetar a CBJ nos cenários interno e externo. Além do Chico havia o Simbaldo, que foi determinante na queda da família Mamede. Juntos eles deram muito trabalho ao Paulo, e com isso os presidentes sempre eram atendidos e prestigiados por um dos dois lados. Os dirigentes hoje são muito fraquinhos. Sentam no colo do Sílvio a troco de nada, e o judô estadual e a base que é totalmente desprovida de investimento que se danem. É aquele velho ditado: “Oposição forte, gestão forte. Oposição fraca, gestão fraca”. Mesmo sabendo que eu apoiava o Paulo, o Chico sempre me tratou com deferência e se dispôs a colaborar com a minha gestão. Ao contrário daquilo que muitos dizem, ele sempre se preocupou com o desenvolvimento do judô em todas as regiões do País, os que o temiam na verdade defendiam interesses pessoais e benesses oferecidas pelo Paulo.
Você crê que com a atual gestão corremos o risco de viver uma nova era Mamede?
Vai ser pior porque o professor Joaquim tinha uma grande vantagem: ele tentava levar os dirigentes para o lado dele. Dava de dedo, brigava e tentava conquistar seus desafetos. O Sílvio é covarde. Ele faz tudo pelas costas e só chama as pessoas para uma conversa se tiver um trunfo para chantageá-las. No mano a mano ele não enfrenta ninguém, e isto é a pior coisa que existe.
Você acredita que o ex-presidente da FCJ atende às demandas de gestão da CBJ?
De forma alguma. O Sílvio não possui uma visão empresarial e pensa pequeno. O pior é que possui um perfil desagregador e com isso não reúne gente capacitada à sua volta. Aos poucos ele mesmo vai destroçar a equipe que o Paulo tinha na administração. Só não eliminou determinadas pessoas do primeiro escalão porque o Paulo Wanderley está segurando, mas em breve não restará muita coisa da estrutura que fez a CBJ ser líder no segmento da gestão esportiva. Ele é uma pessoa obtusa e se crê acima de tudo e de todos. Soube recentemente que a situação da entidade é extremamente delicada e que os problemas estão agravando-se na área financeira.
O que você sabe?
A entidade já acumula vários protestos, possui títulos descobertos e tem salários atrasados. Eu só não entendo como uma entidade que vive à base de verbas públicas pode ter títulos protestados e esteja comercialmente negativada. Será que o Ministério do Esporte e o Comitê Olímpico do Brasil têm ciência de que a CBJ está negativada?
Como avalia o momento que o judô catarinense atravessa?
Como grande otimismo. Os professores mais jovens têm feito uma avaliação bastante positiva do desempenho da equipe capitaneada pelo professor Penso. Ele tem o perfil de um grande gestor e tenho certeza de que em breve terá os professores de todo o Estado ao seu lado, inclusive aqueles que o Sílvio conquistou com graduações e nomeações. Rapidamente o Moisés recolheu os cacos e reagrupou o grupo que estava disperso. Tenho certeza de que ele vai limpar a casa, e oportunamente promoverá uma grande virada em nossa modalidade.
Qual foi a melhor coisa que o judô te ofereceu?
Amizades preciosas, sem dúvida alguma.
Qual foi a sua maior decepção no judô?
Quando o Nélson Wolter e o Sílvio Acácio inventaram toda aquela mentira e acusaram a Lelis de coisas que ela nunca fez. Ver seu sofrimento e vergonha foi a pior experiência que vivi. Eles foram muito baixos e inescrupulosos. O lado positivo foi que com esta atitude eles finalmente revelaram o que são.
Fazendo um randori rápido quais foram os melhores judocas de cada área?
Atleta, Yasuhiro Yamashita; árbitro, o professor Maranhão, do Rio de Janeiro; dirigente, prefiro não opinar.
Para você o que é ser judoca?
Ser judoca é ser uma pessoa gentil, humilde, respeitosa e respeitada. Ser judoca é acatar incondicionalmente as leis, a hierarquia e, na medida do possível, dar alguma contribuição para a sociedade. Aliás, esta deve ser a principal meta do judô: contribuir decisivamente na construção de uma sociedade mais harmoniosa.
Interview
28/06/2018
Por PAULO PINTO I Fotos BUDOPRESS e ARQUIVO
Curitiba – PR
Link da matéria: http://revistabudo.com.br/nao-quero-ser-cobrado-pelo-que-acontecera-na-cbj/